terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Par que é ímpar

O ano de dois mil e oito, apesar de par, para mim foi ímpar. Singular desde o seu primeiro dia: o primeiro, em muitos anos de minha vida, em que eu não parecia um zumbi, e passava mal de ressaca - decisão não de começo de ano, mas de fim. Desde o dia dez de novembro de 2007, assumimos, eu e marido, o compromisso de passar alguns meses sem beber. E meses já são 13, e sem vontade nenhuma de voltar a esse hábito que se mostrou, ao longo dos anos, tão nocivo para nós dois.
[abre parênteses]
não nos convertemos; não falamos mal de álcool, ou de quem bebe; não hasteamos bandeiras contra a biritagem, nem tampouco viramos chatos abstêmios, daqueles emburrados que matam de sono a noite de qualquer um. Nós apenas chegamos à conclusão de que PARA NÓS a vida é bem melhor sem ele.
[fecha parênteses].
Descobrir-me tem sido minha maior aventura, e meu melhor passa tempo. E se os últimos três anos têm sido de descobertas, este foi o das mais certas, fortes e gratas. Surpreendi-me sendo vencedora do concurso “Novos Autores”, e tive a felicidade de passar alguns meses namorando o nascimento desse filho: escolhendo a capa, fazendo a revisão, redigindo agradecimentos e uma pequena biografia para a orelha.
Neste ano doei-me mais do que sabia ser capaz, e senti toda a dor de lidar com uma realidade que eu não supunha – nem nos meus piores pesadelos. Perpassaram por mim tantos sentimentos intensos e contraditórios, que quase sucumbi. Mas apanhei-me de pé, apesar dos safanões, e pude me orgulhar da escolha de manter-me assim. Nessa brincadeira de “não é bem assim que a banda toca” soube de coisas que não queria ter sabido, escutei outras que não merecia nem ter ouvido, e fechei-me para repensar o meu papel na vida de todos aqueles que me cercam - os que me gostam, os que julguei (mal, diga-se) que me gostavam, e os que amo de todo o meu coração. Conclusão: não há ninguém que mereça mais os meus cuidados do que eu mesma. Estando cuidada, bem, e feliz, fatalmente quem me gosta estará feliz. É também esta, uma excelente forma de filtrar pessoas.
E eu... eu, gente, com alma falo: posso, quero, e mereço apenas o que for bom. O que não for - só lamento – não está, nem estará, entre as coisas que cultivo. Em dois mil e oito celebrei meus trinta e um anos no domingo de eleições municipais, na “Praça do Calango”, quintal de minha mãe, com alguns poucos e bons amigos, além da família, que dispensa comentário, mas inspira cada dia mais agradecimentos. No mais particular dos anos que vivi, este, que com felicidade e orgulho vejo findar, sem sentimento algum de que ele escorreu pelas minhas mãos como de outras vezes, deparei-me com uma Samara capaz.
Capaz de fazer escolhas; capaz de por elas trilhar, e lutar. Capaz de estabelecer estratégias e alcançar metas. Capaz de descobrir mecanismos de auto-motivação, e manter o foco. Capaz de cair e levantar; capaz de envergar e não quebrar; capaz de aprender com os erros, de rever atitudes, e de se olhar criticamente.
Devo confessar que nunca havia sentindo algo tão espetacular quanto isso; pelo que de positivo me traz, e pelo que de negativo de mim tira. Não sou mais uma criatura tentando se equilibrar numa corda bamba. Não fujo, ou pego um atalho a cada obstáculo que aparece. Não desisto diante da possibilidade de sofrimento. Não estou mais munida de inúmeras desculpas para a minha inércia, nem tenho o meu dedo apontado para os prováveis “culpados”.
Longe, ainda, de todas as conquistas que pretendo, apenas me orgulho de estar conseguindo dar os primeiros e mais importantes passos.
Se me perguntares que conquistas são essas, devo dizer que não é nada como ser presidente da república, receber o Nobel de Literatura, ou ganhar o próximo Big Brother. Quero conquistar serenidade e paz, ser menos ansiosa, concluir meu curso superior, continuar escrevendo, dar minhas aulas, ganhar e juntar uma grana, estudar mais e mais... e garantir equilíbrio, financeiro e emocional, para o filho que vamos ter.
Chego ao dia 22 de dezembro deste ano “ímpar”, feliz comigo, amando mais o meu marido, por tudo o que a gente viveu nesses quase 365 dias, e por ele sendo amada; agradecida a Deus pelas graças alcançadas e pela sorte de ter a família e os amigos que tenho.
A vocês, desejo que o ano de 2009 seja verdadeiramente novo, se assim o quiserem; que vocês possam construí-lo e vivenciá-lo com saúde, paz, bem e felicidade.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

A Graça que Gonzagão traz



A semana começou com Luiz Gonzaga no carro. CD de 1972, “ao vivo” no Rio de Janeiro. Já no início do disco, ouvindo-o repetir “se eu nascesse de novo”, e contar o que faria, emocionei-me de ver que na verdade ele contava sua vida, e afirmava que “se eu nascesse de novo”, faria tudo exatamente igual: filho dos mesmos pais, nascido na mesma terra que se diz ser pobre, e de gente sofredora.

Luiz Gonzaga já seria motivo suficiente para um texto. Seria até suficiência demais, dada a sua genialidade e importância. Mas não é ele que me traz aqui, a esse texto, e sim o que ele me trouxe. Melhor, aonde ele me levou.

Fui à “manhã de sol” da Associação Recreativa dos Trabalhadores em Telecomunicações do Estado do Piauí – o “Clube da Telepisa” – passeios certos dos sábados da minha infância. Vi meu pai e a Graça, minha madrasta, no meio do salão, com seus passos em pulinhos, e seus sorrisos cúmplices de alegria.

Aguaram meus olhos de saudade daquela mulher que conquistou o posto de “mãe II”, com o aval de nossa mãe. Saudade doída de tudo o que ela foi. Da alegria, da irreverência, do jeito de falar fechando os olhos, dos cabelos muito pretos e lisos com seu corte “Chanel”. Saudade das estratégias que bolávamos pra convencer meu pai dos passeios que queríamos; das visitas ao trabalho dela, quando eu voltava do colégio; de ouvi-la me apresentar como sua filha.

Mas chorar, eu chorei mesmo foi a saudade do que não foi; do que poderia ter sido; do que seria hoje, se ela estivesse aqui. Certamente eu ouviria a Graça pedir neto cada vez que me encontrasse. Riria do jeito dela de falar com o Alexandre, que ela não conheceu, mas pressinto que tipo de relação teriam.

Chorei os “eu te amo” que eu não disse. Lamentei ela não ter sabido o quanto foi, e é, importante pra mim.

E choro enquanto escrevo, pedindo a Deus que hoje ela saiba. E que também saiba que agradeço por ter dividido conosco o amor de mãe; e por ter se importado; e por ter me dito coisas que eu precisava ouvir, e ter calado outras que eu não entenderia, e que agora sei; e por ter deixado conosco um pedaço seu - um irmão - que é quase um inteiro, de tão parecido que é, em personalidade e fisionomia, e que a cada ano que passa, para nossa felicidade, estampa a mãe mais e mais.

Luiz Gonzaga que me perdoe o papel secundário que teve. Mas a Graça era assim: quando chegava, ocupava todos os espaços. E ao contrário da tristeza que transpareço, pela saudade que mesmo depois de oito anos não sabe ter outra forma, é de alegria que me abasteço, quando nela eu penso.

P.S.s.:

Obrigada, pai, por ter sabido escolher nossas mães.

Obrigada, Rômulo, por ter dividido sua mãe com a gente.




quinta-feira, 20 de novembro de 2008

tatuagem

Conheci meu marido há quase dez anos. Foi uma arrebatadora e confusa paixão; dessas que destroem telhados, e espalham centelhas.
De início ele me deu dois maravilhosos presentes. Primeiro um bonsai com o tronco retorcido em forma de “s”, muito bem acompanhado de seis CDs do Caetano laçados em fita furta cor. O segundo, a tatuagem que ele fez no braço – uma bateria com um bonsai, com seu tronco em “s”, estampado no bumbo. O bonsai na tatuagem era uma maneira de estar comigo, ele dizia.
Não ficamos juntos por muito tempo. E apesar disso, a tatuagem continuava lá. E continuava minha. Viveria para sempre entre nós, na lembrança do que vivemos, seja que destino guardasse Deus para nós dois.
Passaram-se quase dois anos sem nenhum contato até que nos reencontramos. Não preciso dizer muito, já que hoje ele é meu “marido”.
Por muitos anos pensei no que eu poderia rabiscar “no meu muro”, que fosse suficientemente importante – tão importante como minha pele, única – para tatuar. Semana passada, sem que “procurasse”, encontrei um verso do Cântico dos Cânticos, da bíblia, que diz: “o meu amado é meu; e eu sou dele”. Nunca havia decidido nada tão rapidamente em toda a minha vida. No dia seguinte eu estava na sala de espera da Moral para estampar em mim, em hebraico, o meu amor.
A única dúvida que tive, ou melhor, ressalva, é que não acredito no amor que se apodera do outro como propriedade, e era este o conceito que a tradução denotava.
Eliminei a restrição já de saída, já que mim o verso não traz esse sentido, traz a idéia de reciprocidade, de troca, de companheirismo: ele é meu e eu sou dele. Não é o pronome possessivo “meu” que me dá o significado, é a conjunção “e”. Meu amor é correspondido, o amor dele também o é.
Some-se a isso ser escrito em hebraico, de onde vem o meu nome [Samara, enviada por Deus]. E foi Ele mesmo quem deu o arremate. Em todo o sentido dessa tatuagem há o agradecimento a Deus, e a certeza de que o nosso amor, e nosso casamento, é por Ele abençoado. Não poderia estar mais feliz com minha decisão. O tatuador, Thiago Kabeção da Moral [ué, não ouvi o barulho da caixa registradora. Rs.] foi maravilhoso: paciente, delicado, seguro e atencioso. Aproveitei e coloquei “hoje” no pulso, também em hebraico. Mas o porquê disso é coisa pra outro post.
Ps. I. Adolescente [dessas maiores de 18, que a Moral é loja responsável e não tatua menor de idade] espantada quando eu disse que tatuagem não saía nunca mais... “ai, é? Mas a Kelly Ki [sei lá como escreve] tirou o rosto do Latino...!”. Mais espantada fiquei, de ver como tem gente com um total descompromisso com a própria pele, e completa ignorância sobre as conseqüências dos seus atos. É... pois é... fazer o quê?
Ps. II. Ainda não tirei foto, mas como Papai Noel está a caminho com meu presente de natal, assim que chegar disponibilizarei para apreciação pública a minha obra de arte. Quer dizer, do Thiago. Mas devo dizer que a tela – meu cupim, como diz a mamãe, região abaixo da nuca - é um espetáculo à parte, o que só contribuiu para o engrandecimento do artista [hahahahahaha]
Beijos, pessoas que aparecem por aqui pra retirar as teias.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

charada

E o que acaso seria, meu amigo, o amor?
seriam palavras doces ao invés de silêncio de dor?
Seria o amor só mel?
seria o amor um só?


Acaso amor não seria,
Meu caríssimo senhor,
Pitada de mel num dia
No outro tiquinho de dor?


Seria ela a tal mistura,
Que tanto se quer traduzir,
Em que se colocam agruras,
Ao tempo em que se faz luzir?


Mistura que assim, bem misturada
Um dia é face do fazer bem
E no outro,
Também,
É face de fazer mal.


Para Luizinho, que escreveu “Represa” lá: http://la.barreto.zip.net/ e inspirou o que cá está.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Felicidade

Ser feliz é uma escolha. Beira o absurdo dizer isso numa época em que felicidade parece ser coisa para meia dúzia de escolhidos. Ou coisa que se vende em embalagens coloridas com letras garrafais, em alguma prateleira.
Ser feliz é uma escolha. Uma escolha que não significa que vou estar contente, alegre e satisfeito vinte e quatro horas do meu dia, mas que todos os minutos vou ter em mente que fiz uma escolha: ser feliz, e que o meu propósito é manter este estado de espírito. Felicidade é um estado de espírito. Um estado permanente, eu diria.
Escolher ser feliz me dará a possibilidade, ou mesmo o direito, de estar triste algumas vezes; de reclamar do preço da gasolina, de achar que a grama do vizinho é mais verde. Mas me dará, também, a certeza de não ser infeliz, com seus estágios mentais negativos e sombrios.
Veja bem, eu escolho como essência da minha alma a felicidade, e assim terei como pauta da minha vida o meu bem-estar. Porque quero! Porque posso! Porque mereço!
Uma escolha como esta não me trazer a felicidade reluzente dos sorrisos dos comerciais de pasta de dente. E talvez não traga a esfuziante alegria de dirigir um carro do ano ouvindo a trilha sonora de um filme estrelado por uma atriz linda e loura, apaixonada por um bonitão arrasador, também loucamente apaixonado por ela. Talvez não traga. Mas certamente, escolher ser feliz, na sua essência, vai te trazer a satisfação de estar sempre cuidando muito bem de você. E isso é felicidade.

domingo, 21 de setembro de 2008

Manchetes

[o que se estampa nos anais da minha própria residência] 1. Samara Eugênia recebe a primeira prova da capa do seu primeiro livro “Tantas Quantas Proesias”, e aprova.
E como aprova!!!
2. O responsável pela arte é o jornalista Ilustrador, caricaturista, designer gráfico, letrista e cometedor de poemas Paulo Moura.
A escritora confessou para esta colunista que ficou impressionada com a capacidade do artista de captar exatamente, veja bem... E – X – A – T – A – M – E – N – T – E... o que ela queria, sem nem ter perguntado.
3. Samara teve um colapso nervoso com a proximidade do nascimento do “filho”.
e vomitou o texto da 4ª capa do livro, que deveria ter sido racionalmente escrito. Aviso: racionalidade é coisa que não lhe cabe,nem lhe cai bem.
4. Comemoram bodas a escritora Samara Eugênia e o músico Alexandre Naka.
Bodas de papel colorido com giz de cera e areia brilhante. São 2 anos, 6 meses e 27 dias casados. Na contabilidade geral, quase oito anos juntos. Na contabilidade mais geral ainda, quase dez anos daquele dia em que se olharam pela primeira vez.
E na capa: Mulher de 30 anos se diz ser a mais feliz do mundo! p.s. link pro blog do Paulo Moura: http://paulomourateresina.blogspot.com/

domingo, 31 de agosto de 2008

Ode a mim mesma

Não faltasse oportunidade, vontade ou motivo, Não faltassem clamores - internos, pungentes Sobrava-me modéstia Faltava-me ousadia. Agora ocorre que venho e canto, E rendo-me em homenagens a mim A mim mesma, mui merecedora de honrarias Que tem? Que tem que eu sou mesmo é porreta, [como bem se diz pelas bocas de minha terra] E por não saber-me, Ainda não o tinha dito. Oras, oras, se não é o título que já diz tudo? Se não é a mim, e somente a mim que venho cantar? Com palavras de amor me presenteio E não custo a encher-me de grande orgulho, Afastando as feições de “que é isso, são teus bons olhos” sorrindo largo em satisfação. Agora sim, me faço justiça, E conto o amor, que em mim, Hoje é mais que canção. [para mim, pra você, pra nós... nós mulheres, que por vezes esquecemos o quanto somos importantes]

quarta-feira, 4 de junho de 2008

conta-gotas

conta-gotas Nada de dor a conta-gotas Que chova em mim, Que alague em mim, Que em mim, A dor seja enchente. Que toda ela se derrame Hoje! Inunde Hoje! Alague Hoje! Amanhã me espera o sol de peles e sorrisos coloridos E os meus novos dias, Ah, esses... Apenas, virão!

sábado, 31 de maio de 2008

Você entende de amor?

Não falo do amor facilmente traduzido em palavras, tantas vezes contado e cantado. Não falo desse amor muitas vezes banalizado pela facilidade da pronuncia de três pequenas palavras: eu te amo. Falo do amor velado, de um olhar aparentemente desatento, que não ostenta a dramaticidade de um acontecimento... aquele que é só olhar, puro e simples, inteiro em seu brilho e sua entrega, como o do pai que olha o filho em suas primeiras letras.
Falo do amor que não é consentimento, que é contrário, que é recusa. Aquele que se recusa ao fácil “sim”, e se demonstra em difícil “não”, mas com todo o compromisso de quem pensa no futuro dos seus. Não falo do amor romantizado, do que dá a lua em presente, falo daquele que é presente, que é presença, que é certeza de não estarmos sozinhos.
Falo do amor que não é beijo nem afago. Daquele que é puxão de orelha, que se contenta com a incompreensão, na certeza de ser formação, e não paliativo; porque a vida não está para os moralmente fracos, para aqueles que esperam, para os que descansam. A vida corre como corre o tempo, e o amor de que falo, sabe bem disso.
Não falo do amor que é aparente sacrifício e renúncia, mas que na verdade só serve de cômoda desculpa para erros pessoais, e se revestem em culpa para os destinatários do amor. Não falo desse amor opressivo e castrador.
Falo do amor que é compromisso. Do que apesar de nem sempre fácil de se ver, está lá, em algum canto, despreocupado com reconhecimento, mais ocupado em ser responsável. Falo do amor que é caridade, não a que simplesmente dá, e a “mão do porvir” esconde, mas aquele que não só oferece as sementes, como ensina a preparar o solo, a regar e cuidar; o amor que sabe, respeita, e ensina o tempo das coisas.
Do amor que falo, você entende? Levante o tapete para onde o varreu julgando-o inútil. Coloque as lentes de “enxergar”, se ainda sua vista embaça. Este amor está aí em todos os “nãos” dos que lhe amam verdadeiramente, está no sorriso disfarçado do seu pai, está no doce que lhe prepara sua rabugenta avó, está nas renúncias diárias e despretensiosas de sua mãe.
O amor de que falo, não se traduz em palavras, se revela em pequenos gestos, que não são, senão, a grandeza do amor de que quase nunca se fala.